Thursday, December 14, 2006

BETA - III

É estranho conhecer seu próprio futuro. Mas os amados das Musas sempre têm este dom. Prevêem o futuro e conhecem o passado. Porque elas mesmas sabem tudo o que foi e o que está por vir. Elas os contam. Sopram em seus ouvidos em forma de versos, com notas de flauta, sempre que a cítera vibra. E assim Iolau acordou sabendo que haveria de lutar naquele dia. Mas as Musas foram caprichosas, não contaram se ele venceria ou não. Ele apenas saberia que teria de lutar. Por isso acordou cedo, já com lágrimas nos olhos, Heleno estranhou, porque normalmente Iolau acordava com esperança no dia. Era o que seus olhos deixavam ver. Alguma esperança. Mas desta vez não. Ele foi desolado para a cantina, comeu pouquíssimo e pouco falou com Heleno. Era somente com ele que Iolau falava. Arrastou sua espada e seu escudo até o campo, demorando-se sob a chuva, e quando um Irenai ordenou os treinos, ele lutou.

Isso era verdade. Quando Iolau precisava lutar, se defender. Ele nunca fugira. Já brigara com alguns meninos até arrancar sangue e cabelos deles. E nos treinamentos apesar da pouca força, usava toda a ela. Ele sabia que não podia deixar de aprender aquilo que estavam os ensinando ali. Ele pensava inclusive que a forma mais fácil de passar por tudo aquilo era aprender o oficio do deus da guerra o mais rápido possível para poder voltar pra casa. E ele teria agora que lutar, ele sabia. E faria. E tentaria vencer. Foi ai que ouviu:

- Onde está o músico?

Riram. A chuva redobrou sua força.

- Cadê tua cítara, bonequinha?

- Acho que cantar para o paidonomos não adianta né?

- Ele vai correr logo que chegar ali em cima.

- Ele deve é chorar!!

Ele chegou aos pés de Artemidoro martirizado. Seus cabelos escorridos e sua roupa molhada pela chuva davam-lhe uma aparência ainda mais frágil. Lágrimas forçavam passagem, mas o professor levantou-o pelo queixo e olhou diretamente nos olhos negros de Iolau. Iolau nunca esqueceria este olhar que recebera de seu professor. Cálido. Tranqüilizador. Ele notou o rosto másculo de Artemidoro também neste instante. Um queixo quadrado ornado por uma bela e macia barba que estava molhada pelos pingos da chuva, olhos castanhos profundos e carinhosos, um cabelo castanho liso e bem cuidado, encharcado, que apesar de preso na parte de trás da cabeça deixava que alguns fios escondessem suas temporas. Artemidoro segurou seu queixo e disse-lhe:

- Tens o nome de um herói heráclida, honre-o.

Anquises então apareceu na sua frente. Ao ver aquele menino, que apesar de ter sete anos como ele mesmo, passava perfeitamente por um menino de onze anos, Iolau se apavorou. A partir daí foi tudo muito rápido.

- Anquises, a bonequinha já chora!

- Acaba logo com isso, Anquises!

- Mole! Efeminado!! Dado a prazeres!! Descontrolado!

- Agora tu aprendes a ser homem! Agora aprendes!

- N-não é justo que eu lute desarmado!

- Basta!!

- Anquises venceu!

E ele passou a ver tudo em vermelho sangue. Caiu no chão. A chuva desabou sobre sua cabeça. Com seus joelhos fracos. As lágrimas brotaram em quantidade. Doía-lhe o corpo todo. As coxas. O rim. O rosto. E ele ouvia os gritos de vivas se afastando. Foi quando sentiu um pano tocar-lhe a face. Alguém limpava a lama que ele tinha no rosto. Ele então levantou seu rosto pra olhar quem era e deu de cara com os olhos verdes e preocupados de Heleno.

- Calma! Não foi tão ruim assim! Você lutou bem.

Iolau só conseguia soluçar. Seu corpo arquejava.

- Não suje sua roupa.

Foi a única coisa que ele conseguiu dizer, empurrando a mão de Heleno para longe do seu rosto.

- Há sangue. Temos que limpar. Respondeu Heleno.

A chuva continuou mais grossa. Os cabelos loiros de Heleno havia se tornado escuros por causa da chuva. Seu corpo de menino estava todo exposto, e Iolau não deixou de notá-lo. Foi quando Heleno se levantou e olhou para as nuvens. Iolau ficou na altura de suas coxas roliças. Heleno então lhe estendeu e mão e falou para eles irem. Ajudou-o a se levantar e enquanto caminhava falou:

- Vamos para a cabana, não haverá mais aula hoje por causa desta chuva. Não terminará tão cedo.

Iolau tentou olhar as nuvens, mas uma pontada nas suas costas não deixou que ele erguesse a cabeça. Ele então continuou apoiado nos braços de Heleno até a fonte que servia de banho para os estudantes. Heleno tentou despir Iolau. Mas este não permitiu. Disse que ficaria envergonhado.

- Nem meus irmãos me viram nu antes. Comentou.

Heleno meneou a cabeça. E mesmo assim despiu seu amigo. Ele deu-lhe banho, limpando com cuidado os ferimentos que Anquises provocara. A chuva continuava caindo. Heleno aproveitou e lavou suas roupas e as de Iolau, e nus, os dois voltaram para as barracas. Heleno então retirou de debaixo de sua cama uma coberta de lã de carneiro, ricamente bordada. Iolau tremia meio inclinado, porque não dava para ficar completamente ereto naquela cabana. Heleno explicou q era para o inverno e juntou a palha das duas camas e cobriu com a coberta. Deitou-se e disse:

- Venha!

Iolau deitou-se num canto. Heleno riu e o puxou pra perto de si.

- Assim não dá pra gente se enrolar, né, Ios?

Iolau sentiu-se ruborizar, pelo apelido novo e carinhoso, pelo corpo de Heleno se aproximando do seu, mas, antes que ele fizesse algo, logo o braço bronzeado de Heleno envolveu seu corpo, puxando a ponta da coberta de lã que estava mais longe e envolveu os dois meninos. Iolau sentiu o calor do corpo de Heleno. E uma tranqüilidade arrebatadora tomou seu corpo e mente. As pernas do menino loiro tocando as suas, e sua respiração em seu pescoço. Iolau nunca dormiu tão tranqüilo. E nesta noite não houve lágrimas por causa de sua mãe. Ele reencontrara um colo acolhedor.

3 comentários:

Anonymous 3:55 PM  

ui!

gostandoooo!

posta +++

*novos*
bjo!

Anonymous 4:14 PM  

Olá Foxx.
Parei aqui porque sou fascinado por histórias antigas (principalmente quando incluem o envolvimento tão "caliente" entre homens.)
Senti uma grande expectativa e aflição que talvez meus leitores sentiram ao ler as páginas de Ekin, o Viking que escrevi... (www.ekin.blig.com.br)
Aliás fiquei mais ansioso ainda porque existem muitos personagens e as coisas "quentes" demoram a acontecer em Esparta... eh, eh.
Mas é um texto cativante, e de personagens muito carismáticos, parabéns.
Colocarei um link em meu blog para não perder as aventuras de seus jovens guerreiros.
Um forte abraço!

Eduardo 4:33 PM  

Lenin, cada vez mais a historia fica mais emocionante e envolvente.

E me pergunto se esse será o casal da historia? torço por eles!

Abraços

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